Cartas Cabo-verdianas - Cartas Públicas e Cartas Familiares
"ESCOLHEI A VOSSA PENA COMO OS HERÓIS ESCOLHEM AS SUAS LANÇAS; HÁ PENAS NOBRES COMO ESPADAS, HÁ PENAS RELES COMO ESCOVAS DE SAPATOS "
Eugénio Tavares
"Nas Cartas Cabo-verdianas, Eugénio Tavares aparece na sua dimensão de pensador, de fazedor de opinião. Se utiliza a epístola como libelo doutrinário, o panfleto/ensaio terá por base uma emocionante e criteriosa pedagogia social e filosófica da vida entre a raridade de meios e o mundo das pressões estruturantes.
Neste quadro se estabelece o retrato moral, social e político da história da época, onde se ergue o carácter e a personalidade inquebrantável do lutador que Eugénio foi, consciente da grande arma que é a escrita. Dramática e ironicamente, desafia os seus adversários: "escolhei a vossa pena como os heróis escolhem as suas lanças: Há penas nobres como espadas, há penas leves como escovas de sapatos".
Dir-se-á que tanto a epístola como o panfleto, ambos se organizam com a elegância bíblica de um sermão e tem a força inabalável de funda de David quando se impõe a defesa dos superiores interesses dos desamparados e dos perseguidos pelo abuso dos poderosos ou pela incúria dos governantes.
Um talento ainda desconhecido do trovador, poeta e ficcionista se agiganta. Então a consciencialização humanística e colectiva do património da cabo-verdianidade vai sempre adensando pela tangência pessoal ou pela secância colectiva de cada intervenção."
Corsino Fortes
Carta de Eugénio ao Dr. Henrique de Vilhena
Henrique de Vilhena, médico, catedrático na Faculdade de Medicina, em Lisboa e estabeleceu amizade com Eugénio Tavares, aquando de uma visita à Ilha Brava. As cartas foram publicadas em livro pelo catedrático, constituindo um valioso documento para conhecimento da obra do poeta Eugénio Tavares. Essas cartas foram enviadas pelo próprio médico ao Professor José Lopes, em S. Vicente, que por sua vez as entregou aos familiares do entretanto falecido poeta, na Ilha Brava. Abaixo encontra-se um desses exemplares.
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Carta de Eugénio ao Dr. Henrique de Vilhena, datada de 20 de Julho de 1916 |
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Informações adicionais |
Cartas de Família
Para minha Mãe adoptiva D. Eugénia Vera Cruz Medina, na Ilha Brava
Escrevo-te de uma nova residência, que a bondade dos homens, numa irónica expressão caricatural, andou aí durante vinte anos, a preparar-me; e para onde quis a sorte que hoje, 7 de Novembro, me mudasse.
Estou num pequeno aposento, com muito pé direito, irregular, assoalhado de grosso pitch-pine, alta janela fortemente gradeada e porta também defendida por formidável gradeamento.
Neste momento, enquanto entristecido o espírito, traço as primeiras linhas desta carta; a porta acaba de se fechar pesadamente: chiaram os gonzos; estrondeou o ferro nos fortes batentes, como quando se fecha um túmulo. Encontro-me emparedado?
MÃE:
Não é a primeira vez que um homem de honra, justo e altivo sente fechar-se sobre si as portas de uma prisão...
Cadeia Civil da Ilha Brava, 7 de Novembro de 1916
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Cartas aos Familiares e Amigos
As cartas trocadas com familiares e amigos encerram um capítulo importante da vida e obra do poeta. São fundamentais para o estudo e a interpretação do seu pensamento e sobressaem em três grupos:
1. Cartas e postais enviados dos Estados Unidos entre 1900 e 1910 para a sua esposa D. Guiomar Leça Tavares, sua Mãe Adoptiva D. Eugénia e sua sobrinha Eugénia.
2. Cartas aos seus sobrinhos (filhos adoptivos) José e Luísa Medina e Vasconcelos.
3. Cartas para diversos amigos e compadres incluindo Doutor Henrique de Vilhena, Médico Republicano e Político, vivendo em Portugal.
Muitas dessas cartas são conservadas no espólio do poeta, bem como em mãos de particulares e em alguns arquivos em Cabo Verde e em Portugal, esperando um estudo sério por parte de quem de direito.
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